quinta-feira, 18 de agosto de 2016

[Opinião Livros] Ouro Preto, de Sérgio Luís de Carvalho


Ouro Preto, de Sérgio Luís de Carvalho


Editora: Clube do Autor
N.º de páginas: 296
Edição/Reimpressão: 2016

Sinopse: «O paraíso terreal, em que Adão foi criado, está no Brasil, perpendicular ao lugar em que Deus tem o seu trono no céu. Porque no Brasil se acha o fruto da árvore da vida, que são as bananas compridas, e o da ciência que são as bananas curtas, e frutos e rios e delícias.»Pedro de Rates Henequim, profeta e herege (1680-1744) Sérgio Luís de Carvalho é autor de uma vasta obra composta essencialmente por romances inspirados em factos reais e livros de divulgação de histórica. Ouro Preto é o título do seu novo romance, um livro que remete o leitor para uma Lisboa deslumbrada pelo brilho do ouro do Brasil e amesquinhada pela pobreza. Entre a comédia e a tragédia, este romance baseado em factos reais transporta-nos para o cenário ostensivo e bizarro do Portugal setecentista. Estamos em pleno século XVIII, vivem-se perigosas manobras políticas, segredos de alcova, amores, desamores e traições insinuam-se por detrás das procissões, dos autos de fé e das festas cortesãs. Sejam bem-vindos ao reinado de D. João V, o rei que nos fez sonhar com o ouro preto.O ritmo e a linguagem dão vida à narrativa, intercalada amiúde por cartas de Pedro de Rates Henequim dirigidas a D. Nuno da Cunha e Ataíde, cardeal e inquisidor-mor do reino, e missivas de Alexandre de Gusmão para D. Luís da Cunha, embaixador de Portugal em Paris. "Ouro Negro" é um romance que se lê num ápice e no qual reconfirmamos Sérgio Luís de Carvalho como um dos principais autores portugueses de romances históricos da atualidade. «Sendo certo que, como se disse antes, mesmo a noite mais escura é sempre sucedida pela luz da madrugada, assim a subida ao trono de El-Rei D. João V iluminou o Paço Real com uma chama dourada que os tempos vindouros se encarregariam de lustrar ainda mais. (…) E então foi um estupor brilhante. Se outrora a humilde corte portuguesa mais se parecera com um beatério de arrabaldes ou com um palacete de província (o que causava desgosto nas infantas estrangeiras que vinham para matrimónio, acostumadas a outros requintes cortesãos), se outrora a corte portuguesa fora um beatério ou um palacete, dizia-vos, eis que agora, com o novo rei, a dita corte se enfeitou de refinamentos e francesismos a que ninguém estava habituado. As damas começaram a poder entrar no Paço, primeiro lentamente, lentamente entrando nas alas palacianas, nas Salas dos Embaixadores ou dos Leões, mirando em soslaio à sua volta assim como quem não quer a coisa; mas depois, passada a surpresa por tamanha liberalidade, logo elas encheram as salas de froufrous roçagantes e de sorrisos escarninhos que faziam os homens olhá-las quando elas passavam, fingindo, é claro, que não davam por nada.»

Opinião: Este livro foi para mim uma estreia, não só no autor como no mundo dos históricos portugueses. Sou bastante fã do género, mas curiosamente nunca me tinha aventurado pela história de Portugal. Quando tive a oportunidade de ler este livro fiquei imediatamente interessada, ansiando por conhecer um pouco melhor a história do meu país.
Ao ler a sinopse (não esta aqui presente, a que está na contracapa do livro), não esperava de todo encontrar o livro que encontrei. Achava que seria uma história contada por um narrador não presente no livro, mas a mesma é contada por mais que um narrador, todos eles presentes no livro, na maior parte das vezes através de cartas. Assim vamos conhecendo Pedro Rates de Henequim, um homem condenado que vive demasiado no seu mundo religioso, e Alexandre de Gusmão. A partir destas cartas conhecemos não só as histórias deles, como o que anda a acontecer pela corte portuguesa naquele período. E assim fui tendo a descrição de diversos acontecimentos, na corte e fora dela. Admito que passei um bocado ao lado daquilo que acontecia na casa de D. João V, já que é muito mais interessante ler sobre o povo, as dificuldades que o mesmo passava e os costumes deste. Claro que se denota ao longo do livro muitos pormenores machistas, que muito me fez pensar no papel da mulher na sociedade daquela altura e como ela era tão desvalorizada.
Em termos de personagens, foi difícil apegar-me a algum, até porque todas as cartas escritas eram demasiado cordiais para expressar sentimentos. Assim sendo, não havia grande emoção por parte dos personagens e não havia grande motivo para apegos a não ser algum sentimento de injustiça. No entanto, acabei por gostar de Pedro Rates de Henequim, por ser tão eloquente e por realmente lutar por aquilo em que acreditava, mesmo que fosse contra a mentalidade de todos à sua volta. Não conhecia o personagem histórico e não fazia ideia de qual tinha sido o seu final na sua vida real, então chegar ao fim do livro e perceber o que lhe aconteceu foi uma pequena facada. Num mundo ficcional uma personagem assim interessante não mereceria um final, mas infelizmente estamos a falar da vida real e portanto, numa época muito mais arcaica e menos tolerante, a sua diferente maneira de ver o mundo não podia trazer coisas boas.
Em relação à escrita de Sérgio Luís de Carvalho, foi uma boa surpresa. Apesar de ser uma escrita bastante formal, perfeitamente adequada à época que o livro retrata, permite uma leitura fluída. As cordialidades e as palavras de época não me afectaram nem um pouco o ritmo de leitura e acabei por ler o livro até bem depressa. Assim sendo, a minha nota para o autor e para esta estreia é bastante positiva. Fiquei bastante curiosa por ler outros livros dele, leituras essas que tentarei que se proporcionem em breve.

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